O Show Deve Continuar
- James Almeida
- 9 de ago. de 2018
- 3 min de leitura
Atualizado: 26 de mar. de 2019
A todo momento somos surpreendidos por situações que, apesar de muito dolorosas, podem e devem ser perpassadas. Obviamente, é muito duro deixar tudo isso pra trás, e, muitos, senão todos esses momentos singulares da nossa vida devem ser compreendidos e, logo após, superados. “Superar” pode significar qualquer coisa em cada fato desses. Pode ser acalmando a dor no coração derivada da perda daquela tia tão legal, a tia Dália, que sempre aparecia num fim de tarde no sábado, quando o céu já estava alaranjado, acompanhada da sua bolsa marrom apoiada no antebraço, seus óculos de sol “corujinha” sobre a testa, sempre com aquelas roupas meio démodé (mas que eram um luxo só) e, a cada semana, um presentinho, um mimo diferente. Também pode ser deixando no passado o término do relacionamento com o Diego, os beijos lentos e molhados que você recebia dele antes de ir trabalhar na segunda-feira de manhã, as vezes que iam comer pizza e você se lambuzava de maionese e ele fazia piada sobre você estar suja até no nariz, os encontros com ele às 7 da noite pra ir ao boliche e não derrubar quase nem um pino, as diversas flores e chocolates que você ganhava quando estava num dia ruim e até as suas tentativas de mudar aquele gosto musical duvidoso do garoto. É possível sim superar, também, o seu último trabalho, com seu uniforme azul marinho que parecia enorme em você, as noites que passou em claro corrigindo trabalhos dos alunos, os teatrinhos que fizestes em sala para ilustrar um tema ou pelo menos fazê-lo mais interessante aos seus pupilos, apesar de tudo que passou naquele lugar, quase sem reconhecimento acerca de seu esforço (sem precedentes por sinal) mesmo fazendo o seu máximo sempre.
Sim, é duro demais, machuca muito, traz lágrimas aos olhos e dá vontade de gritar até ficar sem ar quando a mente lembra que você não vai mais abraçar a tia Dália num sábado à tarde, dar dois beijos no rosto e sentar à mesa para ouvir as infinitas histórias sobre Goiás ou São Paulo. Ou, que o Diego não vai mais te mandar uma mensagem de madrugada dizendo “A cada minuto que passa eu percebo que você é a pessoa da minha vida. Fica comigo pra sempre?”, ou tampouco olhar nos seus olhos e prometer que se casariam e iriam viajar para os EUA ou para a Inglaterra. Assim como é horrível estar consciente de você não vai mais atravessar a cidade todo dia às 7 da manhã para chegar em cima do horário e dar aquele bom dia caloroso para quarenta adolescentes sem, ainda, quaisquer perspectivas de futuro. Contudo, lembre-se disso: superar esses momentos não quer dizer, jamais, esquecê-los, ignorá-los, repudiá-los. Ao contrário. Você pode guardar fotos e histórias da tal tia, pode usar roupas que façam lembrar dela e, assim como ela, você pode ser presente a quem você ama. E, falando em amor, que tal continuar a amizade com o Diego e sair com ele sempre que ele estiver afim de se divertir com alguém? Além disso, nada impede de vocês, um dia, novamente namorarem (e aí, quem sabe, casar e fazer todas aquelas firulas, juntos). Isso também vai fazer jus ao que prometeram: ficar um com o outro pra sempre. Outra coisa possível é você fazer um grupinho no Whatsapp dos seus ex-alunos favoritos e ficar trocando várias mensagens todo dia, afinal você sempre vai ser “the best” pra eles e todos vão poder te conhecer melhor, tendo uma visão mais precisa de quem você é de verdade (sem as quadradas demagogias do antigo trabalho).
Todos os nossos dias são diferentes e, em cada um deles a gente aprende, conhece ou supera algo. Coisas, pessoas, sensações, sentimentos, momentos, paixões, gostos, experiências, amores e pensamentos. Mas, mesmo assim, não há, nunca, a necessidade de esquecer do que foi (ou continua sendo) bom pra nós. Nossa vida é como um show, um grande e duradouro espetáculo onde a plateia, o Tempo, assiste ali cada ato. Mesmo com todas as situações que ocorram, é necessário atender ao chamado que diz: “O Show deve Continuar”.
Cabe a você decidir como quer continuar.
Originalmente de JAN/2017.
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